terça-feira, 4 de outubro de 2011

Capítulo TRES - GISELE


“GISELE”

O dia começa cedo na residência dos Martins, e sete da manhã o café já está na mesa e as crianças de banho tomado e vestidas, prontas para as aulas de piano, caratê e natação. Gisele observa enquanto elas fazem a primeira refeição, ao mesmo tempo em que recolhe e separa a correspondência, colocando o jornal no escritório e as contas a pagar no aparador que ostenta um belíssimo abajur de bronze representando uma figura feminina de traços gregos e seios a mostra, peça de decoração que é o xodó do dono da casa, trazida de uma inesquecível viagem a Mikonos faz uns cinco anos.

Mais que uma empregada doméstica, Gisele já faz praticamente parte da família Martins, que a abrigou desde muito nova, quando seu pai perdeu todas as economias em um plano econômico do governo, que limpou a poupança guardada para a compra da tão sonhada casa própria. Sistemático ao extremo, não acreditava em nenhum investimento além da então confiável caderneta de poupança e graças a essa atitude, perdera tudo que havia economizado até aquele momento, praticamente uma vida de serviço tomada por uma única assinatura feita por alguém que não enxerga pessoas em planilhas, somente contas e números.

Como forma de ajudar nas despesas da casa, a menina começou cedo a trabalhar tomando conta das crianças dos Martins, velhos conhecidos de seus pais, amigos dos tempos áureos e que souberam investir de melhor forma suas finanças e não sofreram o forte baque econômico que debilitou de forma irreversível o nem tão forte coração do pai de Gisele, e que hoje mal consegue se locomover em sua pequena casa situada em uma comunidade carente, onde faz bico consertando os poucos eletrodomésticos defeituosos que lhe vem em mãos.

Outrora estudante de colégio particular e cursinho caro, freqüentava clubes badalados e nem sabia por qual porta embarcar em um coletivo, que sonhava se formar em medicina e viajar o mundo ajudando os necessitados com os Médicos Sem Fronteiras, hoje desperta antes das quatro da manhã, arruma a própria casa e pega um ônibus e um trem para recomeçar a rotina de limpar e cuidar da casa, só que dessa vez a de outra família, que mesmo não sendo sua própria, a trata como se assim fosse, e que lhe acolheu quando estava em sérias dificuldades e hoje não a deixa trocar de emprego por nada. Ocupando uma função meio que de governanta, meio que de gerente, controla toda a manutenção do imóvel delegando obrigações entre os vários funcionários do lugar. Partindo do motorista e chegando ao jardineiro, todos eles ficam impressionados com a energia com a qual a pequena e bela figura mantém aquele pequeno exercito funcionando dentro de sua própria ordem unida.

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