quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Trem Bão é Coisa Boa FINAL


Parte FINAL

Sentada na escada da varanda ela observa a estrada enquanto separa a palha das espigas de milho rodeada por dezenas de galinhas que ficam por ali esperando um ou outro grão que se desprende e cai fora do cesto e que é disputado a ferozes bicadas.

-Até parece que estão passando fome, seus bichos doidos!

De um tempo pra cá ela vem sentindo muita falta do casal de jovens lá de São Paulo e fica se repreendendo: -Nunca vi isso, depois de velha a gente fica sofrendo por causa dessas bobagens...

Nisso um som bastante familiar lhe chama a atenção e ela olha a tempo de ver a antiga caminhonete de seu Joaquim fazer a curva e diminuir a velocidade até parar em frente à porteira.

-Ô de casa! Tomei a liberdade de trazer a correspondência da senhora que estava lá na caixa de correios comunitária lá na mercearia.

-Obrigada, seu Joaquim, eu nem sei quando é que ia poder dar um pulo lá pra comprar umas coisinhas de que ando precisando!

-É só a senhora me passar a listinha que mais tarde o menino trás de moto.

-Gasta agora não. Depois eu vejo direitinho o que to precisando e mando a lista pelo caminhão de leite.

Sobe a rampa conferindo a correspondência e se surpreende ao encontrar a carta com o carimbo da agência paulistana entre as contas de energia elétrica e o jornalzinho da cooperativa.

Ansiosa, rasga a lateral do envelope e puxa o papel bem dobrado. Imediatamente começa a ler a mensagem escrita em letra bem caprichosa e em papel decorado de flores.

“Oi vó, sua mais nova neta está morrendo de saudades! Como estão as coisas por aí? Aqui estamos bem, trabalhando muito, é claro, mas conseguimos uma folga na semana do feriado do dia 12 e planejamos passar esses dias aí, será que tem problema nisso? Já não estou mais agüentando o barulho da cidade. To aflita, até sonho com o cheirinho do mato e o gosto dos biscoitos.

Ah, tenho uma surpresa pra senhora! Em breve vai ter mais um mineirinho de coração pra correr atrás dos pintinhos no quintal! Esse sim vai ter uma infância completa, de bicho de pé e joelho esfolado!

Quando a gente chegar eu conto as outras novidades, to morrendo de saudades! Beijos!

Sua neta favorita.”“.

Emocionada, ela sente as pernas falharem e se senta novamente. Toma consciência do cheiro forte e adocicado das flores da jabuticabeira e do canto contínuo e sibilante das cigarras.

– Vão chegar na época certa! Vou ensinar minha neta a fazer aquela geléia caseira!

O sol avermelhado começa a se esconder entre as árvores no horizonte criando longas e tristes sombras.

-Essa é uma das horas mais bonitas do dia. Lusco fusco? Por do sol? Ocaso? Qual a melhor maneira de chamar o poético momento?

_Aurora?

–Não, aurora é de manhã, uai!

–Aurora?

Ela se vira na direção da voz e divisa entre os fulgurantes raios de sol uma imagem esmaecida que aos poucos vai ganhando nitidez. Tal visão lhe tira o fôlego. O que antes era apenas uma sombra disforme se transforma em um cavaleiro trazendo aos cabrestos nobre corcel.

_Meu Deus! Exclama ao perceber que a presença ali era a de seu velho, conduzindo a fiel Bailarina, sorrindo e lhe estendendo a mão.

_Aurora, Aurora minha velha, já pode vir comigo. Nossa missão aqui já foi cumprida. Essa boa herança que carregamos por toda uma vida não vai mais ser perdida. Agora chegou a hora de descansar...

FIM

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